Delitos informáticos, uma discussão necessária

AutoreFelipe Cardoso Moreira de Oliveira
CaricaAdvogado, especializando em Ciências Penais
Pagine51-73

Felipe Cardoso Moreira de Oliveira Advogado, especializando em Ciências Penais pela PUC/RS e Conselheiro do Instituto Transdisciplinar de Estudos Criminais.

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@1. Introdução

O final do século XX vem sendo marcado por um avanço tecnológico de alta velocidade, por uma diminuição das fronteiras e barreiras culturais e económicas dos países, pela necessidade de informação e pela facilidade de acesso, tanto físico como virtual, aos mais distantes pontos do globo terrestre.

Taís fatos facilitam a integração entre os povos e culturas, bem como trazem avanços científicos, sociais e económicos, acarretando um desenvolvimento global de particulares e de nações.

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O instrumento capaz de possibilitar esse avanço, grande responsável por estas mudanças de final de milénio, sem dúvida, é o computador. Inicialmente uma máquina gigantesca utilizada para a realização de cálculos e limitada a um ramo específico de atividâdes, constituise hoje num equipamento portátil, capaz de proporcionar acesso a qualquer local do planeta, sendo utilizado numa gama infinita de atividades - capaz de salvar vidas, mas, também, de causar danos, tanto económicos, quanto de funcionamento dos aparatos estatais, podendo, até mesmo, ser utilizado para matar.

O presente estudo tem por objetivo trazer a discussão da problemática dos delitos informáticos, característicos de sua natureza tecnológica, bem como daqueles que sempre fizeram parte de nosso cotidiano e que hoje apresentam novas formas de execução realizadas com o auxílio de computadores, assunto que, embora discutido mundialmente diante da realização de atividades criminosas cada vez mais vinculadas aos computadores, não gerou no seio da comunidade jurídica nacional uma troca de ideias mais profunda ou, até mesmo, relevante.

A importância dada por outras nações aos delitos informáticos, está intimamente ligada ao aumento das relações económicas entre particulares e governos de diversos países, Hoje, qualquer adolescente pode, por seu computador pessoal, realizar compras de produtos fabricados e vendidos por lojas de Hong Kong. Além do comércio, também é perfeitamente possível, por exemplo, que um indivíduo residente em Nova York ingresse, desautorizadamente, no sistema de uma instituição financeira localizada em Singapura, para realizar uma transferência económica para uma conta corrente de um banco de Sidney, ou ainda, alterar ou destruir programas de gerenciamento dessa instituição.

Como se percebe, o progresso tecnológico trouxe consigo um avanço na forma de cometimento de delitos, gerando insegurança mundial e levando inúmeros países a discutir essa matéria. Caso o Brasil deseje ingressar na chamada globalização da economia, integrado ao crescimento das relações existentes entre os países mais desenvolvidos, faz-se necessário o estudo desses delitos, além do desenvolvimento de técnicas de investigação dessa nova atividade criminosa.

Não basta a simples elaboração de leis relativas a esse tema, é necessária uma discussão global, alicerçada na preocupação de reprimir essas condutas, no Código Penal vigente e, sobretudo, nas garantias constitucionais e de direitos humanos concernentes a cada cidadão.

A simples criação legislativa, sem a necessária discussão prévia, poderia ensejar a criação de uma lei incapaz de combater a criminalidade informática, de uma lei supérflua - pois várias dessas condutas poderiam se adequar perfeitamente â legislação existente - ou, ainda, fato que causaPage 53 maior preocupação, de lei contrária às garantias fundamentais dos cidadãos previstas na Carta Magna, desconectada do Direito Penal moderno e de sua utilidade, apenas como última ratio, fato não raro dentro da floresta legal em que vivemos.

Desta forma, esse trabalho traz consigo a preocupação de apresentar a matéria, de arrolar as principais atividades delituosas praticadas por meio de computadores, de trazer alguns casos de utilização criminosa desse instrumento de desenvolvimento cultural e, oxalá, ser a semente de uma discussão nacional necessária desse tema, tão cuidado por professores, legisladores e cientistas de outros países, e olvidado pela grande maioria dos estudiosos brasileiros.

@2. Esclarecimentos terminológicos

Antes de ingressarmos propriamente na problemática dos delitos informáticos e dos realizados mediante o uso de computadores, faz-se necessário esclarecer alguns termos técnicos utilizados no presente estudo, em função dos operadores do direito, não estarem muito familiarizados com o léxico informático.

O computador é formado por elementos de hardware e software. O hardware se constitui na parte física do computador; é a parte mecânica do mesmo; é o teclado, o monitor, o gabinete, enfim, são todos os componentes físicos do computador. Software, por sua vez, é uma determinada sequência de comandos, realizados em uma linguagem própria que põem em funcionamento a parte 'hardware do computador, controlando seu funcionamento. E o software que estabelece e possibilita as tarefas a serem realizadas; são os chamados programas. Um computador sem software não é capaz de funcionar, podendo ser comparado a um livro sem letras ou desenhos. Além dos programas propriamente ditos, software é toda a forma de expressão existente no computador, desde informações até vìdeos gravados no disco rígido.

O disco rígido, também chamado de winckester, ê o elemento de hardware que armazena todos os software. Qualquer programa instalado ou documento que se deseja gra¥ar no computador será armazenado nesse espaço físico.

Os Dados são elementos formadores das informações armazenadas pelo computador. Cada caráter v.g., letra, espaço, vírgula, possui um código numérico. Ao se gra¥ar ema frase para o disco rígido, não são armazenadas as letras ou sinais integrantes dessa oração, mas o códigoPage 54 correspondente a cada caráter na sequência desejada que, ao ser acessada, corresponderá ao texto digitado. Uma letra é formada por uma seqiiêncía de dados que constituem-se no menor elemento formador de uma informação. Um dado isolado não possuí significado algum. À informação é o conjunto de dados que carrega consigo um significado.

Internet. Também chamada de Information Superhighway. "A Internet não é mais que uma rede gigantesca e de âmbito mundial que conecta centenas de milhares de computadores - cada um dos quais podendo estar conectado a sua própria rede local." "Ela é simplesmente um enorme conjunto de computadores individuais"2.

Para se conectar à Internet é necessário um contrato entre o usuário do computador e um provedor de acesso. Esse contrato obriga o provedor, mediante pagamento de uma mensalidade por parte do interessado, a fornecer acesso à rede mundial de computadores. Para ingressar na rede se faz necessária uma ligação via modem (dispositivo físico, interno ou externo ao computador, que conecta seu computador a linhas telefónicas para a transmissão de dados digitais) ao provedor de acesso que após solicitar a digitação de uma senha, se a mesma estiver correta, remete-o para a Internet, possibilitando a conexão com computadores ligados no mundo todo.

World Wide Web é a parte integrante da rede onde se situam as chamadas home pages. Às home pages, como o próprio nome diz, são páginas criadas por pessoas físicas, jurídicas, governos, etc, e que se apresentam à disposição de qualquer usuário da internet que deseje acessála, conhecêla, e obter informações sobre um assunto específico. As home pages também são conhecidas por sites.

Webmaster é o administrador da home page, E quem cria e atualiza o site.

Download ê o ato de gravar um determinado arquivo à disposição em algum site para o computador do usuário.

Rede é a ligação feita por meio de cabos, fibras óticasoe linhas telefónicas em que se conectam mais de um computador. Pode ser interna, unindo computadores de um escritório de advocacia,» ou externa, cujo principal e maior exemplo é a Internet.

Correio eletrõnico ou e-mail, ê a forma mais comum de comunicação eletrôníca. As correspondências (mails) são enviadas em segundos dePage 55 um computador para outro. Agilizou a comunicação nacional e internacional, economizando tempo e dinheiro.

Chat ê um local de bate-papo que se encontra em alguns sites da Internet. E uma "conversa" envolvendo diversas pessoas que se comunicam, em tempo real, pelo teclado de seus computadores. Não existe censura. Qualquer pessoa pode falar o que bem entende, não havendo nenhuma exigência de identificação; apenas um codinome fictício.

@3. Conceito

A primeira grande discussão acerca do tema reside na sua conceituação. No que se constituem os delitos informáticos? Diversos autores trazem conceituações e nesse momento se faz necessária a apresentação das mesmas, bem como, tecer algumas críticas quando necessárias.

À Polícia Federal japonesa, segundo o professor japonês Atsushi Yamaguchi3, define os delitos informáticos como "atos, dolosos ou culposos, que obstruem a função de um computador ou rede, bem como deles se utilizam de forma ilegal".

Essa conceituação, perigosamente, atribui a conduta culposa a prática do delito informático.

Sendo o computador uma unidade de trabalho de conhecimento e desenvolvimento constante, como se poderia atribuir a alguém a prática de um delito informático a partir de uma conduta culposa? Seria juridicamente relevante a conduta de alguém que por imperícia causasse o travamento de uma rede de computadores? Creio que não. O dolo é fundamental na atividade do agente dessa nova prática delitiva. Tipificar essa ação na forma culposa afugentaria aqueles que estão se familiarizando com esses instrumentos de progresso da humanidade, restringindo sua utilização a técnicos em computação, causando um retrocesso no desenvolvimento e agilidade da sociedade.

Charles L. Owens4, díretor da Seção de Crimes Financeiros do FBI, em exposição realizada ao subcomitê de tecnologia, terrorismo e informações governamentais do Senado norte-americano em março de 1997, definiu como Computer Crime o...

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